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Documentação das prática educativas através das experiências e Narrativas insurgentes



Educação é mesmo um caminho emocionante, minha vida escolar inspirou-me a seguir este percurso; o reconhecimento de que vivo com o outro, intervenho com a comunidade, estudar e aprender com o coletivo motiva-me, é meu jeito de fazer pesquisa, ver e entender as coisas, pois é algo que constantemente diz-me: ‘à boniteza da vida está em aprender e a ensinar, a liberdade pela qual luta ensina a amar’.

Imagino essas palavras como se outra pessoa disse-as para mim. Hoje, dia 12 de setembro, tivemos, mais uma vez, um encontro do Grupo de Estudo e Pesquisas em Educação e Cultura - GEPEDUC (http://dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/596), Universidade Federal do Triângulo Mineiro - MG. E no dia anterior o retorno das atividades do Grupo de Estudos em Educação Científica - GEEC, da Universidade do Estado da Bahia, campus VII.

O GEPEDUC mantém seus encontros nas manhãs de sábado, buscamos compartilhar e catalogar práticas educativas, são momentos que unem professores à pesquisa, ao registro de suas práticas escolares, oportuniza a socialização, reflexão e crítica de tais práticas, nos faz ver a práxis pedagógica refletida. Hoje, em especial, nos emocionamos, ao falar de Freire, ao saudar o espaço da escola, tão caro e significativo para nós educadores. Imaginar aqueles e aquelas que nos aguardam , que também anseiam nossa volta, e as lutas conflitos que ocupam o chão da escola e o fazer pedagógico.

Imagino a escola este lugar seguro, confortável, para que cada um ali possa sentir-se livre, afetado/a pelo conhecimento e pelos sentimentos daqueles que compartilham momentos que sempre serão lembrados; pois me coloco neste lugar de aprendiz, rememorando minhas próprias vivências escolares. Ansiamos pela volta.

Não quero banalizar a situação em que vivemos, a pandemia do corona vírus, não quero desmerecer a dor da perda familiar e de amigos por conta dessa doença que assola todo o mundo, porque isso também nos deixa triste, isso também é motivo de nossas angústias. Quero que pensemos naqueles que sentem que suas vidas circulam e gera quando em comunidade, na comunidade escolar.

Comunidade esta que concorre símbolos de reciprocidade, generosidade, amor, mas também de conflitos que podem nos deixar aquém das expectativas sociais, pessoais e familiares. Porém, ainda assim, lugar de convívio, mesmo dúbio, mas onde cada um pode demarcar seu lugar, seja “incomodando” o/a professor/a pela conversa paralela, seja “sentando” na fileira da frente para ser o primeiro a responder aos exercícios. Ou o/a professor/a que desenvolve práticas escolares diversificadas e significativas, ou contrário.

No dia anterior, no encontro do GEEC, UNEB, na sexta-feira, falamos sobre o materialismo histórico dialético, a psicologia social, Vigotski, a discussão nos fez compreender as intenções por trás de falas comumente ditas por professores e professoras com relação aqueles/as alunos/as que sentam no fundo da sala de aula, que conversam, “incomodam” à aula do professor/a. Somos construídos numa sociedade que nos faz pensar que a culpa pelo nosso insucesso é pura, simplesmente e unicamente nossa. Temos saúde, educação, emprego, tudo ao alcance de nossas mãos, se não pegamos, tomamos para nós, a culpa é nossa, por isso ouvimos tanto aquela frase na escola “esse/a menino/a não quer nada com à vida”.

Essa frase é tão forte, não querer nada da vida, não ter sonhos, não ter expectativas, não ter vida... Essa afirmação sem qualquer maldade dita e repetida quase que todos os dias por anos, por diversos profissionais da educação, marca destinos, podemos ter ouvido quando alunos/as, agora profesores/as repetimos sem pensar nas consequências disto na vida daqueles que as ouvem.

Caso sonhos se percam pelo caminho imagino que em algum momento o amor pecou. O conhecimento não foi significativo, não tocou, afetou, ou fez sentir.

Rememoro a minha experiência escolar, que me oportunizou vivências que me fizeram sonhar, tive momentos que me feriram e estas feridas doiam tanto que as não queria vê-las sangrar, me motivando a buscar saídas para não revivê-las, enxergá-las, acreditei que me instrumentalizando pela educação poderia alcançar o que buscava.

Nem todas as pessoas encontram meios, oportunidades, chances que as fazem acreditar na educação, em si e no outro, na sociedade. Desistir também não é algo fácil, pois tira uma parte importante de nós, não pense que aquele/a que demonstra ‘não querer nada com à vida’ sente-se confortável em abandonar seus sonhos por desacreditar em si e no outro.

Lembro do intervalo das aulas no Colégio Estadual Júlio César Salgado, meus amigos que faziam teatro no turno oposto, me ensinavam as técnicas que aprendiam, lembro de brincarmos de pegar coisas pesadas, nos olhar no espelho, costurar roupas, tudo utilizando à imaginação e a corporeidade. A professora de redação que usava as músicas de Zé Ramalho para interpretá-las e relacioná-las com o cotidiano, seu incentivo para lermos as obras de Machado de Assis, perdi a conta de quantos e quais livros lemos deste autor. Lembro do jornal O Ábaco, de matemática, as notícias dos grandes matemáticos, que eram ao mesmo tempo filósofos, astrônomos, médicos, mas que sempre deixavam um problema para nós resolvermos. Ou quando a professora de português nos pediu para escrever um conto e ao ler o meu, pela primeira vez, alguém disse que eu era uma escritora. Sinceramente não me recordo do que escrevi, mas nunca vou me esquecer de sua expressão de surpresa, como me olhou, o que disse.

No ensino médio, no Colégio Modelo Luís Eduardo Magalhães montamos um grêmio estudantil, fizemos caminhadas, protestamos contra o preconceito que um amigo nosso sofreu por ser gay, só paramos os protestos quando a direção da escola foi trocada, arrecadamos livros na comunidade, líamos, atuavamos, cantávamos e dançávamos, uma das atividades que existia nas aulas de redação nos fazia analisar desenhos, ligar pontos, escrever sobre nós, creio que isto me ajudou a não interromper o processo de escrita.

Nos encontro dos grupos de estudos, GEEC e GEPEDUC, tivemos uma discussão sobre à questão curricular das licenciaturas das diversas áreas, falamos em especial das áreas de exatas e ciências da natureza, que carregam em suas identidades formativas e profissionais o distanciamento da pedagogia, muitos de nós pedagogos ouvimos dos colegas dessas áreas citadas, dizerem estou me formando biólogo, matemático, químico; e a professoralidade fica aquém nesta identidade docente. O que se materializa na escola, no fazer -se professor/a da educação básica. As didáticas conteudistas sem qualquer contextualização com à comunidade e a realidade dos/as alunos/as.

Desconhecendo o desenvolvimento dos sujeitos, desintegrando práticas aos saberes populares, ao desenvolvimento de uma pedagogia para a liberdade. Ouvimos também reclamações que a “educação não muda”, “que não para frente”, mas não nos abrimos para enxergar as próprias miopias que cercam à própria professoralidade.

Bem… Hoje, educadora, coordenadora pedagógica, quero que experienciem à formação docente como espaço privilegiado da construção de novos saberes, fazeres e afetamentos; que o deslocar-se, mesmo sendo dolorido, seja apreciado, pois o percurso reflete em crescimento e em percepções de si e do outro que torna a prática pedagógica comprometida e ética. O mais do mesmo já nos cansou, queremos avançar em práticas escolares que possamos enxergar nossos rostos e ouvir nossas vozes.

E a escrita autoral pode nos oportunizar isto; incentivar à escrita seja nos mais variados gêneros textuais, nas mais variadas formas de expressar-se, nos dá, a todos, oportunidade de degustar à sensação, o devir epistemológico, intelectual e afetivo que é colocar no papel nossos sentimentos, formações, aprendizagens e reflexões. A cada palavra escrita damos um passo para a cura de nossas feridas e um passo para a nossa liberdade.

Nem sempre vamos encontrar pessoas que nos vejam com o valor que merecemos, ou ouça a nossa história, é preciso conhecer-se, analisar-se, estudar a si para compreender o outro. Imagino uma árvore que finca suas raízes no solo, quando conhecemos nossas raízes, nossa história, à si, dificilmente ventos fortes nos derrubarão.

Este movimento de escrita na escola deve ser impulsionado cada vez mais. Através de poemas, contos, diários, enfim, há diversos gêneros que podem causar identificação e gosto pela leitura e pela escrita, mas é preciso um primeiro passo, e este passo é dado por nós, os responsáveis por estudar, pesquisar e desenvolver a política de educação dentro da escola, na sala de aula. Não adianta culpar o/a aluno/a se nós não nos damos uma chance, uma oportunidade para refletir em algum momento nossa professoralidade, nossa identidade docente, e de construir uma prática educativa que seja realmente revolucionária, implicada, engajada com o outro.

Nas idas e vindas da escrita autoral, as práticas educativas elucidadas no GEPEDUC, convidam professores e professoras a escreverem e ir além, expor suas práticas no coletivo. Por que nós mesmos/as fugimos da escrita, fazemos nossos planos de aula e isto já basta. Escrever é algo fora do cotidiano de professores/as, coordenadores/as pedagógicos/as, a rotina corrida da escola nos permite escrever nossos projetos para implementá-los, mas não registrar todo o processo e refletir sobre ele, construir avaliação e uma retomada neste processo sobre o nosso fazer, como conseguimos afetar os/as alunos/as, infelizmente, na maioria das vezes ainda não faz parte da rotina da educação.

A própria avaliação não faz parte da rotina da escola. A utilizamos para pontuar, rotular, aprovar ou reprovar, mas não criar um devir formativo sobre ela, não criar estratégias de retomada sobre aqueles conteúdos que a maioria não conseguiu compreender. Colocamos à culpa no tempo, nos dias, no horário, no/a aluno/a, na família, mas não nos damos chance de nos colocar protagonistas neste processo de auto-reflexão. Como se o ego não nos desse chance ao erro, e aprender com ele.

E se ao voltarmos para a escola depois desta pandemia, insistíssemos nessa atividade de escrita autoral, no registro de tantas práticas educativas que fazem da escola este universo dinâmico por parte dos/as professores/as, a fim de refletir nesta retomada os acontecimentos das práticas, os afetamentos e os deslocamentos construídos?

No GEPEDUC vemos a potencialidade que é fazer este movimento, o quanto fortalecemos nossa identidade docente nos colocando neste lugar de aluno em auto-avaliação. Ao retomar nossas ações de nossas práticas educativas, observamos e sentimos como elas nos tocam, afetam, ou seja, é um afetar de si e do outro, de resiliência, vai e volta. E ao fazer isto no coletivo, em colaboração, em grupo, a ação se torna mais leve, porque não estamos ali para julgar as práticas dos colegas, nossas contribuições são para homenagear, crescer, incentivar, aclamar a educação e a escola, e o quanto ela é humana, revolucionária, uma potência e o quão pode ser amor como prática de liberdade.

Hoje em nosso encontro ouvimos e repetimos esta palavra: LIBERDADE. Paulo Freire está presente e nos ensina que a educação deve partir do nós, ao discutirmos a prática apresentada sobre a literatura de cordel na escola, sentimos e vivenciamos isso.

A literatura de cordel é um dos gêneros mais complexos que existem, ela é genuinamente nordestina, único gênero literário nordestinos, quiçá brasileiro, criado por nós. E ainda assim vive na marginalidade da nossa língua, como ao menor, apoio para projetos e práticas extracurriculares, porque a julgamos mais fácil para os alunos construirem, porque a simplificamos em rimas.

O cordel exige métrica, rigor, regra. Cordelistas ou poetas do cordel lutam pelo reconhecimento e valorização de sua arte. Nós educadores/as falamos sobre a importância do cordel para a literatura brasileira, nordestina, parafraseamos Boaventura de Souza Santos para falar de uma educação que deve partir do sul, nascer do sul, mas não temos cordéis nas bibliotecas escolares, nas prateleiras das nossas estantes em casa.

Ainda temos muitas miopias, muito a percorrer, nós todos. O pré entendimento de que o cordel é algo ‘fácil’ esconde muitas coisas, uma delas é aquilo que buscamos para nossas práticas escolares, que é um fazer educativo mais significativo, próximo de nós, dos/as alunos/as. Torna a complexidade do ensinar e aprender em algo que nos representa, que transparece nosso jeito de falar sobre os mais variados assuntos, discutir política, religião, contar causos, sorrir, emocionar. Por isso parece fácil, porque é próximo a nós, nos identificamos com esta arte.

Contextualizar a educação, tornar os saberes populares e a memória coletiva viva e presente na escola é um desafio que pode nos envolver nesta docência implicada e apaixonante. O nós deve ser o centro e não à margem, como que ocupando lugar de marginalidade. Paulo Freire no sertão, lá no Angico alfabetizou jovens e adultos em apenas 40 dias, porque tornou o conhecimento próximo aos alunos/as, foi preso por isso, mas seu legado nos inspira à revolucionar nossa identidade e nossa prática docente.

A entender o conhecimento como sinônimo de liberdade. Que possamos encarar nossas miopias e ter coragem para se colocar no lugar de aluno e aprender com o outro, ter a generosidade de olhar e ouvir para conseguir afetar aqueles e aquelas que aguardam por um lugar, uma oportunidade de se colocar, se posicionar, dizer o que sente e pensa, de ser visto em suas potencialidades.

Não podemos mais repetir essa frase “você não quer nada com a vida”. Ao contrário, a vida te chama, ela é difícil e complexa, eu também estou aprendendo a cada dia, e cada um carrega os instrumentos necessários para lutar e não desistir.

Caso contrário, estaríamos nos enganando, acreditaríamos estarmos sendo ótimos professores só pelo fato de ter alguns na turma que se dedicam aos estudos, tem boas notas, estes são bons alunos em qualquer escola, independente de nós, somos professores de uma turma e não de poucos.

Aprendamos com Freire, o amor pode sim ser prática de liberdade, que a generosidade seja autêntica em nossas rotinas, que a escola possa ser este lugar onde nascem bonitezas, práticas educativas críticas, políticas, revolucionárias, que a escola seja um lugar onde os sonhos nascem e manifestam-se, onde a criatividade e a inventividade tomam forma e des-formam, onde o amor é a ferramenta para quebrar esta cultura de desamor que insistimos em replicar. Que a escola seja a própria liberdade.





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